Pediram para que marcasse hora, pois agora, era preciso aviso prévio. Ordens da chefe, nova senhora. Eu tinha pressa e assim fui recebido até sentar-me sem cerimônia.
Por um momento, até que iniciasse a fala, esperei que a anciã despachasse o que faltava. Seria o próximo.
Observei. Das paredes descascadas, texturizadas pelo mofo, várias formas abstratas. Entre nuvens e cabras, juro ter identificado um Cristo. Faltavam placas no forro, muitas, e por entre as que restavam, como comidas e em pedaços, fixei a atenção na possibilidade de ver passar um roedor medonho. Então, nem atentei, em perceber que me falavam. Depositei o foco ao nada. Queria apenas dizer que dali iria embora, que não sentia mais, aquele, como um lugar próprio, mas impróprio. Porém, a educação e a ética, o respeito e o medo, e mais o fato de ter um rato caindo sobre minha cabeça, embotaram meu curto e despreparado discurso. Por um momento.
Começo a rir, sem muito disfarce. A mão, escondendo a boca e os olhos, para não ver o obvio: Estava dentro de um filme de terceiro mundo. A cadeira, a frente, de espaldar alto e assento baixo, escondiam atrás da mesa o corpo curvo da mulher pálida de cabelos brancos, a quem, até ali, deveria chamar de dona, patroa, ou senhora. O riso, foi imaginar as flores fugindo do estampado do vestido, exageradamente colorido, espalhando-se sobre os papeis e relatórios; pela tábua, derrubando as xícara manchadas de café fraco e batom forte; algumas, rosas e tulipas tortas, mergulhando fundo no lixo, transbordado dos seus, aos meus pés… mais afastados; outras, como cravos, terminando em coroa -de pêsames-, Nossa Senhora! Entristeci, no entanto, o humor, ao percebe-la enraizada - pena, vê-la, com os desmandos e segredos- junto ao que a instituição mal guarda.
Quem sabe uma advertência -como resposta- e em minutos estaria dali liberto. E pensar que pretendi acabar assim meus dias, culpa de um pai que burocratizou a vida. Mal exemplo, pelo menos por ora. Nada esta no lugar devido, e nada devo a este lugar sombrio. A velha entorta, também, a boca, e deixa escapar entre a razão, fumaça –pensei que vício aqui fosse proibido. As rosas acinzentaram-se e perderam a graça, nenhum morcego voou pela sala, nenhum gambá sobre nossas costas.
Preciso, logo,dar um fim ao assunto, ser mais econômico e breve, até Mazzaropi deve estar a espera:
“Vim para dar adeus. Adeus sem aviso prévio.”
Um comentário:
Que Maravilha!
Entrei na cena e, à espreita, num cantinho, cheguei a sentir o cheiro do café e do cigarro, misturado ao perfume comprado no freeshop. Moscas anunciando a chuva, além do 'tudo' às moscas, do teto ao piso, dos papéis aos móveis, do servidor ao pobre coitado que amarga desde a madrugada na esperança de não ouvir novamente "já acabaram as fichas"!
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