Neste momento, são sete horas e trinta e cinco minutos da manhã, aqui estou, a esperar carona para a terceira atividade laborativa do dia, que iniciou-se um pouco antes da seis da madrugada com um telefonema de pedido de socorro.
A temperatura é de 27 graus, alta para o horário, o que anuncia um calor, se não igual, muito próximo ao da semana passada que chegou aos trinta e nove traços no ápice do derretimento. Como sei que não terá chuveiro no trabalho, que se emenda a este, que segue do meio dia de hoje, até as quatorze horas de amanhã, e que vou chegar empoeirado e úmido, estou vestindo um modelo despojado, largo e leve para que o suor me grude o mínimo possível.
Quem me pega aqui é uma Kombi com nove, apertados, lugares, seis ficarão ocupados. Por ser desconfortável e barulhenta, explica-se os fones pendurados e a seleção de músicas bem agitadas, não para dormir, mas para abafar o ruído da lataria na estrada, boa parte de terra, e a fala, sem pausa, desinteressante e irritada dos colegas.
Os outros cinco ocupantes, além do motorista, que desde ontem esta com o dedão do pé quebrado, mas que não quis ser afastado porque esta trabalhando em horas-extras, aumentando nossa insegurança por dirigir descalço, todos os demais são mulheres.
Uma tem como companheiro, alguém, que apesar dos vários meses de relatos, até agora não sei o nome que é pejorativamente chamado de “o velho”. “O velho”, deve estar beirando os cem, e tem uma doença terminal que não se acaba nunca, já ouvi, no intervalo das agitadas músicas, diagnósticos como: câncer de pulmão, duplo; enfisema no cérebro; labirintite galopante e gordura hidrogenada nos ríns, no coração e “nos fígados”. O que resume é que conheço toda ladainha de sofrimento que nunca se completa nos curtos 45 quilômetros, ou cinquenta e tantos minutos de sacolejante martírio. Também é dela o fruto gay assumido, filho do primeiro casamento, motivo até a pouco de muito sofrimento, mas agora aceito, pelos presentes e graças que vem recebendo dele e do também velho e mais abastado companheiro. Como afeto nãos e compra de “o velho” a maior preocupação é efetivar em documento a relação instável de três anos que lhe garanta: parte da casa, a guarda dos bichos, e um fuca, que pelo que parece já está estacionado em seu nome.
Das demais companheiras de viagem, uma compartilha a terapia do mp3 e não quase não fala, mas tem um péssimo hábito: ficar comendo salgadinhos fedidos em tão indigesto horário. Nestes casos, procuro manter o mais distante meu delicado olfato, vendo-me obrigado, seguidamente, a arriscar o pescoço o pendurando para fora em uma das pequenas janelas do antiquado utilitário.
A terceira, com quem mais me identifico, troca comentários via SMS, comigo, sem a percepção dos demais e, por vezes, mesmo com algum enjôo o ou náuseas, engasgo-me em risos disfarçados.
A última, e mais isolada, fica restrita a um mundo imaginário e arrota, sem regurgito, muitos bens e viagens, que sequer condiz com a realidade de quem precisa repetir diariamente esta viagem. Entre ela, e qualquer uma das demais, mais do que os buracos do estofamento, surge um arrogante abismo social, irreal e não justificado.
Ainda da foto, a garrafa de coca-cola, que esta ali porque é coca-cola, porque esta calor e porque o café das seis a esta não mais desperte nada.
Street photography e alguns textos, porque nunca se sabe o que pode passar pela cabeça ou pela frente.
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
A cerca desta foto
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário